sábado, 4 de dezembro de 2010

O oráculo do Vale do Silício


Tim O’Reilly criou o primeiro site comercial, antecipou o movimento do software livre e trabalha com livros eletrônicos há mais de 20 anos. Sua vida é a prova de que podem acontecer coisas interessantes quando se trabalha por algo mais do que dinheiro

Como ele prevê o futuro?”

Cabelos grisalhos encaracolados, calça amarrotada e um velho blazer. O americano Tim O’Reilly parece um professor excêntrico, mais que o presidente de uma companhia de US$ 100 milhões. De certa forma, ele assume os dois papéis — é o principal intelectual do Vale do Silício e o fundador de uma crescente e rentável editora, a O’Reilly Media. A empresa de 32 anos suportou quatro recessões e o declínio do livro impresso, e hoje emprega 250 pessoas. Tem uma divisão de aprendizado on-line, um serviço para leitura de livros na internet, uma revista popular chamada Make e uma firma de capital de risco que investiu na Blogger, a plataforma de blogs mais popular do mundo.

O’Reilly esteve no topo de quase todos os avanços tecnológicos importantes das últimas três décadas. Entrou no negócio de livros eletrônicos mais de 20 anos antes do lançamento do Kindle; criou o primeiro website comercial; e ganhou dinheiro com o movimento do software livre quando as patentes ainda dominavam o setor. Em suma, ele é o homem que lhe dirá o que as pessoas inteligentes estarão falando daqui a cinco anos — o homem que prevê o futuro.

Hoje o futuro é algo que O’Reilly chama de Gov 2.0. Ele tira um iPhone do bolso. Olha para o telefone e sorri, como se fosse surpreendido por uma nova descoberta. “A Apple... construiu esta plataforma”, diz. Uma plataforma, comenta, que atraiu cerca de 150 mil apps, nenhum dos quais praticamente criado pela própria companhia. Ele sugere que os governos podem fazer a mesma coisa, mobilizando as energias empresariais de 100 mil jovens. E vem tentando convencer deputados, empreiteiras e qualquer pessoa disposta a escutar que Gov 2.0 não é apenas o futuro da tecnologia; também é o futuro da democracia. “É difícil fazer algo tão grande quanto uma mudança de governo”, ele diz. “É um pouco como construir a ferrovia transcontinental.”

Aos 55 anos, Tim O’Reilly fala com a cálida autoconfiança de alguém que sabe muito mais que você, mas fica feliz em compartilhar. “Meu modelo original de empresa é ‘trabalho interessante para pessoas interessantes’.” Quando não está dirigindo o tipo de empresa que lhe permite trabalhar em coisas interessantes, O’Reilly leva uma vida simples, mas esplêndida. Ele é dono de um par de cavalos brancos da Islândia, assa panquecas e as serve com geleia de morango que ele mesmo faz, e é bem casado há 35 anos. A sede de sua empresa, em Sebastopol, Califórnia — um antigo enclave hippie que se tornou destino popular para excursões de apreciadores de vinhos — fica em um pomar de maçãs de quase seis hectares.

Em meio a essa vida saudável, a O’Reilly Media tem o tipo de impacto normalmente associado a empresas muito maiores. O trabalho de O’Reilly inspirou toda uma geração de empresários — e os posts e ensaios em seu blog podem levar grandes empresas a efetuar mudanças de rumo drásticas. “Tim realmente pode fazer toda uma indústria acontecer”, diz Eric Schmidt, CEO da Google, para quem O’Reilly ajudou a popularizar a web. “O Vale do Silício foi dominado pela falta de originalidade para fazer dinheiro rápido”, afirma Evan Willians, CEO do Twitter. “Tim tem a capacidade de levar pessoas como eu a pensar maior e de maneira mais criativa.”

Antes de iniciar sua empresa, O’Reilly nunca havia visto um computador. Era um estudante do movimento Nova Era. Pousou nesse campo para fazer um favor a um amigo, Peter Brajer, que tinha ganhado um contrato para elaborar textos técnicos, mas precisava de auxílio na parte da redação. A ajuda transformou-se em uma consultoria. “Aprender sempre foi uma espécie de droga para mim”, afirma O’Reilly. Em 1983, ele tinha aprendido o suficiente sobre computadores para empreender na área.

Durante a maior parte dos anos 80, na O’Reilly & Associates não havia empregados em tempo integral além do fundador — apenas terceirizados que apareciam em sua casa quando havia trabalhos de consultoria. “Era um jardim de infância para adultos”, diz Dale Dougherty, um escritor aspirante que O’Reilly levou para sua tribo em 1980 e que afinal tornou-se sócio, com 15% da empresa (O’Reilly possui os restantes 85%).

Isso não quer dizer que O’Reilly fosse indisciplinado. Ele nunca levantou capital externo; financiou seus projetos com os lucros. “Existe um rigor maravilhoso na economia do livre mercado”, O’Reilly escreveu em um primeiro manual da empresa. “Quando você precisa provar o valor de suas ideias convencendo outras pessoas a pagar por elas, isso elimina uma enorme quantidade de pensamento confuso.”

Matéria: PEGN

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